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A orientação da Súmula 262 do Tribunal de Contas da União pode ser aplicada para a interpretação do artigo 59, § 4º da Lei 14.133/2021?

A finalidade do presente artigo é examinar se o enunciado da Súmula 262 do Tribunal de Contas da União pode ser aplicado para a interpretação do artigo 59, § 4º da Lei 14.133/2021.


A resposta da matéria examinada é importante porque define se a presunção estabelecida no § 4º do art. 59 da Lei 14.133/2021 é absoluta (que não comporta prova em contrário) ou relativa (que comporta prova em contrário).


O referido dispositivo legal estabelece:


Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

[...]

§ 4º No caso de obras e serviços de engenharia, serão consideradas inexequíveis as propostas cujos valores forem inferiores a 75% (setenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração.


Assim, fica evidente que, em caso de obras e serviços de engenharia, existe uma presunção de inexequibilidade para as propostas cujos valores forem inferiores a 75% do valor orçado pela Administração.


Na vigência da Lei 8.666/93, havia dispositivo semelhante ao citado § 4º do art. 59 da Lei 14.133/2021, senão vejamos:


Art. 48.  Serão desclassificadas:

[...]

II - propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüiveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

§ 1º  Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo consideram-se manifestamente inexeqüíveis, no caso de licitações de menor preço para obras e serviços de engenharia, as propostas cujos valores sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores: (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela administração, ou (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

b) valor orçado pela administração. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)


E, foi justamente interpretando o art. 48, II, § 1º, alíneas a) e b), que o Tribunal de Contas da União editou a Súmula 262, com o seguinte enunciado:


Súmula 262 – TCU
O critério definido no art. 48, inciso II, § 1º, alíneas “a” e “b”, da Lei nº 8.666/93 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta.

Assim, tendo em vista a semelhança dos dispositivos citados das Leis 8.666/93 e 14.133/2021, surge a questão posta no presente artigo, sobre se a presunção de inexigibilidade estabelecida no § 4º do art. 59 da Lei 14.133/2021 seria absoluta ou relativa.


Sobre o assunto, já decidiu o Tribunal de Contas da União:


NÚMERO DO ACÓRDÃO

RELATOR

BENJAMIN ZYMLER

PROCESSO 005.765/2024-2

TIPO DE PROCESSO

CONSULTA (CONS)

DATA DA SESSÃO

24/04/2024

NÚMERO DA ATA

INTERESSADO / RESPONSÁVEL / RECORRENTE

3. Interessados/Responsáveis: não há.

ENTIDADE

Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos.

REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Não atuou.

UNIDADE TÉCNICA

Unidade de Auditoria Especializada em Contratações (AudContratações).

REPRESENTANTE LEGAL

não há

SUMÁRIO

REPRESENTAÇÃO. POSSÍVEL DIVERGÊNCIA ENTRE A INSTRUÇÃO NORMATIVA SEGES/MGI 2/2023 E O DISPOSTO NO ART. 59, § 4º, DA LEI 14.133/2021. CRITÉRIO DE INEXEQUIBILIDADE DE PREÇOS. CONHECIMENTO. IMPROCEDÊNCIA. CIENTIFICAÇÃO. PROVIDÊNCIAS INTERNAS. ARQUIVAMENTO. 1. O critério definido no art. 59, § 4º, da Lei 14.133/2021 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, sendo possível que a Administração conceda à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta, nos termos do art. 59, § 2º, do mesmo diploma legal.


Importante consignar, que o próprio citado Acórdão do Tribunal de Contas da União, cita, Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com o seguinte teor:


“... Ainda a corroborar a tese de que o melhor entendimento sobre a questão ora em apreço é que o conteúdo do enunciado da Súmula - TCU 262 também é aplicável às contratações regidas pela Lei 14.133/2021, menciona-se o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP) acerca desse tema, já sob a égide da novel lei de licitações e contratos:

TJ/SP, Apelação Cível 1004528-23.2022.8.26.0347, Rel. Des. Antonio Carlos Villen, j. em 8/8/2023.


MANDADO DE SEGURANÇA. Licitação promovida pelo Município de [...] para execução de serviços de limpeza urbana. Desclassificação da impetrante por ter a Administração entendido que a proposta por ela apresentada era inexequível. Pretensão da apelada de que lhe seja concedida oportunidade de demonstrar a exequibilidade de sua proposta. Possibilidade. Presunção de inexequibilidade das propostas de obras e serviços de engenharia inferiores a 75% do valor orçado pela Administração (art. 59, § 4º da Lei n. 14.133/21) que é relativa e não absoluta. Licitação que tem por objetivo selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração, o que justifica a relatividade da presunção, independentemente da natureza do serviço licitado. Sentença que concedeu a ordem. Recursos oficial, considerado interposto, e voluntários não providos”.


Assim, fica evidente, que, o Tribunal de Contas da União, bem como o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, estão entendendo que a Súmula 262 do TCU é aplicável na interpretação do art. 59, § 4º, da Lei 14.133/2021, devendo, em caso de propostas com valores inferiores a 75% do valor orçado pela Administração, ser aplicado o § 2º do mesmo dispositivo legal, para realizar diligências para aferir a exequibilidade  da proposta ou exigir do licitante a demonstração da aludida exequibilidade. 

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